sexta-feira, 26 de novembro de 2010

Derivando a palavra


Tem tanto tempo que eu não escuto alguém dizer que está feliz, que estou quase acreditando que o termo está entrando em desuso. Em devaneio, procuro tentar colocar a culpa no processo de formação de palavra, na derivação sufixal - nunca gostei dela - mas não adianta, ainda se usa acidez para designar uma solução com o pH menor que 7 e chuvoso para falar do tempo natalino.
Então, procuro no dicionário e ela ainda está lá, na edição de 1995. Naquela época, existia Mario Bros, Mamonas Assassinas, Cara-a-Cara e crianças. Hoje a base da pirâmide etária se estreitou e elas gostam de Simpsons na mesma intensidade que eu. E olha que aquilo não é novo e nem desenho para crianças - só mesmo sendo satírico e antipático aos encantos do tio Sam para gostar do Homer . Mas é viciante, tenebroso e infelizmente deixa todo mundo com meio sorriso no rosto, inclusive eles, os infantos, que trocaram as molas dos pés, a alegria em júbilo, pelas bolhas nas mãos e pela lerdeza hipotireoidiana.
E é neste momento que lamento pela felicidade não ser um verbo, se não eu poderia dizer que ele foi rasgado, tal como fotografia em album de família, substituido pelo perfil do Orkut. Pena que cor e brilho não rimam.
Já dizia Guimarães Rosa que "todo mundo tem sua hora e sua vez". Acho que não. Acho que o ponteiro (encrenca de derivação sufixal) resolveu marcar o mesmo tempo para todo mundo tomar de sua sopa (de letrinhas) e o melhor, com colheres padronizadas.
E por falar nisso, e se a reforma ortográfica aboliu a palavra e eu não fiquei sabendo? Bem que me avisaram que ela não ia durar para sempre. E o pior que nem dá para comprá-la, já fui advertida que a felicidade não tem preço.
Deixa para lá, bobeira minha. De qualquer forma, o happiness e o felicité continuaram existindo. E além do mais, pode ser que ela vire uma "saudade" da vida, palavra que só se conhece na lingua portuguesa, mas que nem por isso o resto do mundo deixa(rá) de sentir falta dela, da felicidade.

sábado, 5 de junho de 2010

Essa tal inspiração

Olho para fora da janela do ônibus e vejo mares de morro sem fim. Voltando para casa, em um breve feriado com a bolsa cheia de saudade, roupa suja e ansiedade, penso que a inspiração mora ali, em meio àquelas serras intrinsecas a minha vida estudantil.
É estranho pensar nela como algo personificado. Todavia, parece que ela é branca,com os cabelos claros, aparencia jovial e fica ali, espreitando os meus passos, esperando o momento certo para me pedir um afago. E quando finalmente me aproximo, corre feito louca, tal como vento fazendo cocegas no solo arenoso do sertão. Mas não é sertão, é montanha e ali ela se esconde, parecendo até mesmo estátua basaltica plantada na paisagem.
Por que ela tem que ser tão modesta? Como eu queria que ela pudesse vir e sentar ao meu lado ao longo dessa viagem, me ajudar a concluir mais um texto, para que eu pudesse repousar a cabeça e prosseguir com todo meu trabalho atrasado.
Pronto. Ela desapareceu de novo. Minha mente está inundada por c++, fórmulas e integrais. Agora ela parace estar mais distante. Será que tranquei bem a casa? E parece que ela nunca existiu.
Madura e malíciosa, nos momento que ela deveria estar presente, faz de conta que não exite. Quanta raiva! Meu avô gostava de uma antiga expressão "amigo da onça". E assim eu digo "amiga da onça".
Por que ela não aparece de maneira enfática, quando estamos perto de quem gostamos e nos faz pular no pescoço dessas pessoas para que elas se sintam amadas? Por que ela não me faz pegar o telefone e dizer "oi " para os velhos amigos? Por que ? Por que ela não enche meus olhos de brilho quando vou exercer um trabalho que teoricamente deveria ter alegria em fazê-lo? Por que ela não me segura quando quero tanto terminar a leitura de um livro e o sono, literalmente pelo cansaso, me vence? E finalmente por que ela não está quando quero dizer "Você é importante para mim" com a verdadeira energia que a frase merece?
Ouvi uma estória que perguntaram, se não me engano, a Picasso de onde vinha a inspiração para pintar. Ele sabiamente, disse que não sabia, mas que todas as vezes que ela chegava, estava sentado diante de uma tela, com o pincel na mão.
É obvio que a garota dos cabelos claros se esconde, pois todas as vezes que ela insinua me pedir o afago, estou ocupada demais com provas, conversas cotidianas e relatórios. E assim penso que acontece com praticamente todas as pessoas. As tarefas se acumulam e por isso não temos mais tempo para fazer diferença na vida de outras pessoas, para ajudá-las, para estar frente-a-frente com elas pelo breve motivo de estar. Porque estamos preocupados demais em cumprir aquilo que nos foi proposto, obrigados aos formalismos, à norma de estar sempre presente em uma etiqueta chamada sociedade.


sábado, 3 de abril de 2010

DO TÍTULO

Quem teve a oportunidade de assistir ao documentário Zeitgeist, pode se lembrar, ao entrar em contato com este blog, das distintas opiniões presentes no filme. E óbvio que não concordo com todas elas, nem tão pouco que haja pretensão de fazer deste espaço uma oportunidade para discuti-las, mas seria incoerente iniciar as postagens sem antes falar da inspiração que o longa me provocou.

Não, não é nenhuma piada. Os leitores têm licença para darem suas gargalhadas. Há no mínimo dois anos que a vontade de fazer um blog permeia o meu pensamento. Entre estudos, pressões e dificuldades cotidianas a idéia permanecia somente no plano dela e qualquer coceirinha de vontade era amenizada pelo intenso movimento dos meus dias. Revelo que faltava a ligação (aquela que nos movimenta) entre o intimo e o externo, já que tais eram boicotadas por mim mesmas, por indagações como: "Onde arrumar tempo e inspiração para as postagens?" "E os erros?" e as críticas?

Todos têm medo de errar e ser criticado e confesso também sofrer desse mal. Contudo, quero tentar e desafiar a terrível coragem diante do grande medo.Assim, foi numa sexta-feira, na companhia de três amigos, que assisti ao documentário. Zeitgeist. Em mim, o vocábulo provocou algo diferente, sobretudo após a explanação de seu significado, ainda no início do longa. Um prurido intenso... uma vontade de fazer acontecer aquilo que foi projeto durante anos, seguida por quase uma hora de raciocínios inquietos.

Um som e ZEITGEIST, estava reatada a ligação do movimento. Havia chegado o momento, o tempo de me lançar, como poetou Camões (com perdão do neologismo), "por mares nunca dantes navegados" e escrever.

Dessa forma, prometo me adequar às regras, me ater aos erros, baixar a cabeça diante das críticas e crescer. Da inspiração, juro ser sensível ao guardar os ensejos de nosso tempo. Ah o tempo! creio que ele será a mais difícil das questões a resolver, embora penso que não há com o que me preocupar, já que segundo Emmanuel, "o tempo só destrói aquilo que ele não ajudou a construir".