sábado, 5 de junho de 2010

Essa tal inspiração

Olho para fora da janela do ônibus e vejo mares de morro sem fim. Voltando para casa, em um breve feriado com a bolsa cheia de saudade, roupa suja e ansiedade, penso que a inspiração mora ali, em meio àquelas serras intrinsecas a minha vida estudantil.
É estranho pensar nela como algo personificado. Todavia, parece que ela é branca,com os cabelos claros, aparencia jovial e fica ali, espreitando os meus passos, esperando o momento certo para me pedir um afago. E quando finalmente me aproximo, corre feito louca, tal como vento fazendo cocegas no solo arenoso do sertão. Mas não é sertão, é montanha e ali ela se esconde, parecendo até mesmo estátua basaltica plantada na paisagem.
Por que ela tem que ser tão modesta? Como eu queria que ela pudesse vir e sentar ao meu lado ao longo dessa viagem, me ajudar a concluir mais um texto, para que eu pudesse repousar a cabeça e prosseguir com todo meu trabalho atrasado.
Pronto. Ela desapareceu de novo. Minha mente está inundada por c++, fórmulas e integrais. Agora ela parace estar mais distante. Será que tranquei bem a casa? E parece que ela nunca existiu.
Madura e malíciosa, nos momento que ela deveria estar presente, faz de conta que não exite. Quanta raiva! Meu avô gostava de uma antiga expressão "amigo da onça". E assim eu digo "amiga da onça".
Por que ela não aparece de maneira enfática, quando estamos perto de quem gostamos e nos faz pular no pescoço dessas pessoas para que elas se sintam amadas? Por que ela não me faz pegar o telefone e dizer "oi " para os velhos amigos? Por que ? Por que ela não enche meus olhos de brilho quando vou exercer um trabalho que teoricamente deveria ter alegria em fazê-lo? Por que ela não me segura quando quero tanto terminar a leitura de um livro e o sono, literalmente pelo cansaso, me vence? E finalmente por que ela não está quando quero dizer "Você é importante para mim" com a verdadeira energia que a frase merece?
Ouvi uma estória que perguntaram, se não me engano, a Picasso de onde vinha a inspiração para pintar. Ele sabiamente, disse que não sabia, mas que todas as vezes que ela chegava, estava sentado diante de uma tela, com o pincel na mão.
É obvio que a garota dos cabelos claros se esconde, pois todas as vezes que ela insinua me pedir o afago, estou ocupada demais com provas, conversas cotidianas e relatórios. E assim penso que acontece com praticamente todas as pessoas. As tarefas se acumulam e por isso não temos mais tempo para fazer diferença na vida de outras pessoas, para ajudá-las, para estar frente-a-frente com elas pelo breve motivo de estar. Porque estamos preocupados demais em cumprir aquilo que nos foi proposto, obrigados aos formalismos, à norma de estar sempre presente em uma etiqueta chamada sociedade.